Com apoio da Fapesb, empresa desenvolve software para celular que facilita vida de deficientes visuais
Por: Ascom/Fapesb
Uma pequena empresa baiana é responsável pelo desenvolvimento de uma linha de softwares para celulares, que reúne soluções inovadoras voltadas para o dia a dia de pessoas cegas, garantindo a elas mais autonomia. A NN Solutions, criada há pouco mais de dois anos, uniu o apoio à inovação tecnológica e a atenção da sociedade às questões relacionadas à acessibilidade, e se tornou referência na criação desse tipo de inovação inclusiva.
Segundo o Censo 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 148 mil cegos no Brasil. Com 15,4 mil pessoas, a Bahia é o segundo estado brasileiro com maior número de deficientes visuais e o desenvolvimento de tecnologias assistivas, que promovam a inclusão dessas pessoas, atende a um mercado com bastante demanda. A percepção desse panorama levou a empresa de base tecnológica baiana a dirigir suas ações de pesquisa e desenvolvimento (P&D) para a área de acessibilidade.
Várias soluções em um único aparelho
A linha S-1 é composta de quatro softwares: NNTextReader ou Scanner Leitor portátil (Slep); NNColor_ID, que faz a identificação de cores; o NNMoney_ID, que identifica cédulas monetárias e o NNLight_ID, que informa o nível de luminosidade de um ambiente. Cada solução acrescida ao celular significa menos um equipamento que o deficiente visual precisará carregar.
O Slep foi o primeiro software desenvolvido. Com o aplicativo, o usuário captura textos com o celular e os mesmos são lidos em voz alta. A ferramenta funciona apenas para fontes de imprensa, as cursivas não são legíveis. O segundo aplicativo já finalizado é o identificador de luminosidade. O software informa se o local examinado está claro, com pouca luz ou escuro. Os outros dois softwares estão em fase de ajustes finais.
João Bosco, coordenador do Centro de Tecnologia de Informática (Cetin) do Instituto de Cegos e presidente da Associação Baiana de Cegos, participou do desenvolvimento dos aplicativos. “Logo que a equipe me apresentou as propostas, achei o scanner leitor muito útil. Às vezes, principalmente se a pessoa mora sozinha, recebe documentos em casa e não tem ninguém que possa ler por ela. Com o scanner, ela ganha autonomia”, opinou.
Segundo Bosco, a linha S-1 deve facilitar a independência do deficiente visual. “A grande sacada foi eles terem colocado tudo isso em um equipamento que todos sempre levam consigo e quase todo mundo tem”, disse. A tecnologia dos serviços disponíveis na linha já existe em outros países, no entanto, a importação desses produtos tem um custo muito alto, que justifica o desenvolvimento de soluções locais, com tecnologia nacional. Apesar de os serviços oferecidos na linha S-1 não serem originais para o mundo, a NN Solutions deu um passo adiante, unindo todas as ferramentas no celular.
Consultoria – Bosco sugeriu a formação de uma equipe de consultores com domínio de tecnologias para auxiliar o trabalho. Além dele, que é cego congênito, há mais dois integrantes: um adulto cego há dois anos e uma segunda pessoa que se tornou deficiente visual há cerca de 10. A diferença de perfis influencia. “O software de cores é muito bom para quem já enxergou. Como sou cego de nascença, para mim não faz muita diferença saber as cores, já que não tenho memória visual e não saberia combiná-las”, explica.
O scanner leitor é comercializado desde o início de 2011 e a licença para cada celular custa R$ 1.200 para instalação e treinamento do usuário. Ambos os aplicativos estão disponíveis para os celulares da Nokia com sistema operacional Symbian 3a edição, formato comum na maioria dos celulares da empresa. A NN Solutions já está desenvolvendo a linha para o Android e o iPhone.
Busca por editais – Os editais públicos de fomento à inovação foram os principais subsídios buscados ao longo do desenvolvimento do software Slep. O primeiro foi o edital do Programa de Apoio à Pesquisa na Empresa (Pappe) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Com ele, a NN Solutions conseguiu cerca de R$ 490 mil para investir no desenvolvimento do projeto.
A empresa também venceu o edital de subvenção econômica do programa Primeira Empresa Inovadora (Prime) da Finep, em 2009. Ao todo, foram mais R$ 120 mil da Finep e R$ 30 mil do Instituto de Tecnologia Social (ITS) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Acbal Achy, sócio e gestor financeiro, destaca que essa fonte de financiamento é muito importante para a prática de P&D, principalmente por pequenas empresas. “Nenhuma microempresa vai ter um aporte de R$ 500 mil reais para desenvolver uma ideia que pode não dar certo. Você pode não chegar a uma solução e ela pode não ser viável. E depois disso, o mercado precisa aceitar o produto. Tem que haver procura e quem pague por ele”, explicou.
Uma questão que o gerente financeiro da NN Solutions enfatiza, contrariando o que dizem os editais, é que esse investimento das agências de fomento retorna sim para o governo. “Uma tecla que eu sempre bato é que falam que é dinheiro a fundo perdido, mas na verdade, quando você acaba o contrato, no mínimo 50% já foram devolvidos para os cofres públicos por meio de impostos. Em menos de dois anos, tudo que foi investido é devolvido”.
Planejamento e adaptação ao mercado – A NN Solutions foi fundada em janeiro de 2009, mas o planejamento para sua criação começou em 2008. O projeto incluía 12 pessoas interessadas, todas com formação em engenharia elétrica. A eletrônica de potência, ou seja, como a eletrônica podia conversar com a área de geração de energia, era o foco do empreendimento. Em 2009, a equipe saiu do planejamento e colocou em prática seu plano de ação.
A área de eletrônica de potência se mostrou difícil e com uma concorrência dura. Com a saída do sócio interessado nessa área, a pequena empresa iniciou suas atividades no campo de desenvolvimento em eletrônica, mas não mais na área de energia. Nessa etapa, o grupo já havia diminuído para sete sócios. O começo foi pautado por consultorias e prestações de serviço de curto prazo.
A decisão da área de atuação da empresa veio com a ideia de escrever para o edital do Pappe. Entre as muitas opções pensadas, uma pesquisa de mercado apontou a área de tecnologias assistivas como nova e muito carente de equipamentos e soluções nacionais.
A dura realidade de pequena empresa continuou a reduzir a equipe inicial. Segundo Achy, “houve muito atraso na liberação do recurso e na confecção do contrato, o que fez que nosso grupo reduzisse para quatro sócios”. Além dos sócios, a NN Solutions conta, atualmente, com quatro estagiários e dois profissionais da área de ciências da computação.
Para Bosco, é importante impulsionar uma empresa baiana. “Algumas empresas já me procuraram antes, mas nenhuma da Bahia. Sinto falta do interesse de empresários locais em fomentar essas tecnologias. É muito interessante que a empresa seja da terra, é prata da casa e temos mesmo que incentivar”, disse.
Os atuais sócios da NN trabalharam com pesquisa na universidade e estagiaram em empresas que investem em inovação. “Foi uma dessas empresas que nos motivou a abrir nosso próprio empreendimento. Foi aquela questão: se eles podem, nós podemos também. Há algum tempo, pensar em abrir a própria empresa era uma loucura, coisa de outro mundo. Hoje é um pouco menos”, diz Achy.
Fonte: http://www.cienciaecultura.ufba.br/agenciadenoticias/
Foto: equipe da NNSolutions